Sem ti
A dor teima em não ceder aos efeitos da passagem do tempo. Foste para longe de mim e deixaste-me sozinha, a crescer sem o meu melhor amigo e protector. Mais do que laços de sangue, tínhamos laços de alma. Como se vive à falta de sangue e alma? Como se vive sem os sonhos que sonhamos?
Mais um Natal que se aproxima e, mais uma vez, finjo a aceitação inaceitável da tua ausência. Para onde foste sem mim? Dizem que és um ser celestial a zelar por nós, mas tornaste-te numa dor existencial ao levares um pouco de mim. Para onde? Nem sei. Finjo não querer saber.
Olho para a árvore iluminada e volto atrás no tempo: é por lá que a dor é mais suportável. Volto à casa onde me esperas eufórico, pronto para me contar as tuas últimas aventuras. E contas. Mostras-me os últimos tazos que conseguiste "papar" aos outros meninos. Digo-te com o desdém, tipico da idade, que tenho muitos mais que tu.
Jogamos? Vamos ver quem é o melhor. Gritam connosco interrompendo-nos a brincadeira. Os adultos são tão chatos, sabes?
Engoliamos, o mais rápido possível, o jantar para voltar à brincadeira. Os adultos falavam.
(seguro a lágrima que se forma)
Chegava a altura de abrir os presentes e eu sabia bem o que ia receber. Recebias presentes melhores que eu e invejava-te por isso. E o tempo passou e tu? Éramos inseparáveis, lembras-te? Inseparáveis. Então, para onde foste, que me deixaste esta cratera no peito?
Cresci sem ti. Tornei-me mulher. Tornei-me mãe de uma menina maravilhosa, deixa-me que te diga, que nunca chegaste a conhecer. Tu, congelaste no tempo e nos sonhos de uma vida que nunca chegaste a viver.
Percebo, agora passado tanto tempo, que tive durante alguns anos o melhor presente; tive-te na minha vida: um amigo, um protector, um irmão.
Agradeço-te por teres partilhado os melhores momentos da minha vida contigo. Contínuo à espera do dia em que te reencontrarei, porque, para mim, só estás num local distante, onde não posso chegar. Contínuas vivo e vais continuar no centro do meu coração.