Reflexo do espelho
Quem és tu que me olhas com desdém e ao mesmo tempo com piedade? Quem és? Que queres de mim? Olhas-me com desprezo do que sou. Do que me tenho tornado. Olhas-me como se não fosse quem queres ver. Quem procuras? E olhas-me com piedade como se morresse aos poucos diante de ti. Quem procuras? Quem esperavas que fosse? Quem és tu desse lado do espelho?
Vejo-te confiante e determinada. Segura de ti mesma. Invejo-te e lamento-me. Tu, aí desse lado, tão forte e tão dona de ti mesma. Eu, deste lado, tão insegura e desesperada tentando manter-me à tona num mar agitado. És quem deveria ser. Mas, não sou.
Cada dia que passa é uma luta nesta batalha sem fim. Tento aproximar-me de ti, de como és, mas falho constantemente. Tão próxima e tão distante. Consigo-te alcançar com a mão, mas não consigo chegar-te. Estás aqui, a olhar-me, mas não te consigo tocar. Quando ficaste desse lado do espelho?
Olhamo-nos olhos nos olhos. Vejo-me em ti, mas não me reconheço na imagem refletida pelo espelho. És a imagem de quem devia ser. Mas, não sou. És quem devia ser. Perdi-me no tempo que já não volta. Desviei-me do caminho que devia ter trilhado.
Olhas-me com desdém. Todos os sonhos que sonhei e não alcancei. Todos os projetos que não conclui. Escrutinas-me a alma à procura de um resquício do que devia ser: de ti. Será que consegues ver?
Olhas-me com piedade porque sabes o como me esforcei. Bem sabes que o controle é mera ilusão. A vida prega partidas e nada é como julgamos ser. Ainda me consegues ver.
A essência não mudou. Permanece à espera de se conseguir manifestar.
Olhamo-nos. Estranhamo-nos. Aceitamo-nos. Prometemo-nos. Iremos fundir-nos numa só. Seremos. Serei quem és desse lado do espelho e terás outro olhar para mim.
(Imagem retirada do Google)